sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Alice na Paris das cinco noites - Parte 4



Já no trem Paris-Versailles, depois do embarque na plataforma certa (Rive Gauche, by the way), eu cansei de inventar mentiras e comecei a perguntar sobre a vida dele. Ele era francês? Mesmo com aquele sotaque?

Não, era um italiano lindo. Passado o choque inicial, comecei a praguejar contra o meu desleixo da manhã (perfeitamente justificável, é claro; mas que nesse momento era totalmente dispensável) que me deixou sair com aquela cara de mendiga-drogada-que-dormiu-na-calçada e não da turista em Paris que eu devia ser.

Ele era alto, esguio e tinha essa exótica combinação dos cabelos negros com os olhos azuis. Ok, ele não era nenhum modelo da Calvin Klein, mas tinha aquela aura bonita, de gente de bem. Sorriso franco, educação ao falar e ao agir e aquele sotaque lindo. Ele era um tipão.

Fazia o quê em Paris? Buscava sua vocação: trabalhar com comida. O pai francês lhe ensinou a amar a culinária local e ele estava ali tentando entrar numa boa instituição de ensino na área.

- Enquanto isso não acontece, eu faço bolos e pães para a boulangerie.

Imaginei se aquele bolo de amêndoas tinha sido feito por ele e como estava perfeito, assim como seu sorriso. Já podia me imaginar saboreando mais um pedaço à noite, pensando no meu novo amigo.

E morava com quem? Sozinho. Hum. Já estava lá há quanto tempo? Dois anos. Muito interessante. Ia todos os anos à Italia, visitar a família. Que fino. Ao lado dos seus relatos minha vida parecia um completo tédio. Nasci e sempre morei no Brasil, terminei a faculdade há dez anos e enfiei-me num escritório onde me encontrava trabalhando até hoje. Quer dizer, hoje não, hoje estava a caminho de um dos palácios mais glamorosos do mundo conversando com um italiano habitante de Paris, gato e padeiro de mão cheia. Ponto para mim.

Conversamos animadamente até a estação do palácio. Ele me contou uma série de situações engraçadas que já aconteceram na pequena padaria e como foi difícil acostumar-se ao dia a dia da cidade, tão diferente da pequena propriedade onde sua família mora na Itália. Alternamos o francês e o inglês para nos entendermos melhor, enquanto caimos na risada a cada escorregada no português ou no italiano. A viagem passou num minuto, nem parecia ter saído de Paris.

Que sorte conhecer esse gato. Mas sorte, mesmo, mesmo, mesmo, seria ele ter gostado um pouquinho de mim.

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