quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Alice na Paris das cinco noites - Parte 3



Levantei a cabeça, respirei fundo, deixei o frio me entorpecer. Passei a mão nos meus cabelos gelados e percebi que esqueci o gorro. Pensei em como as coisas não saem como esperamos, em como imaginamos e não alcançamos e na mesma hora me senti besta por filosofar a partir do meu traje de frio incompleto. Boba.

Mesmo sem fome, entrei na mesma boulangerie e pedi a uma atendente mais simpática um croissant e um café, pour emporter. Aproveitei e, lembrando do bolo de amêndoas, perguntei à francesinha simpática como chegaria a Versailles. Podia ser um bom começo, sair da cidade dos apaixonados.

A mocinha loira começou a me explicar atendo-se às plataformas que eu não podia acessar para não pegar o trem errado, tornando a coisa toda muito complicada. Eu devia estar fazendo uma cara muito estranha por que nessa hora um estranho se aproximou:

- Eu vou para aquele lado, posso te acompanhar. Deseja? – falou um rapaz alto, com cabelos pretos bagunçados, radiantes olhos azuis, um sorriso brilhante e um francês com uma pitada de sotaque italiano. Puro contraste com meu cabelo oleoso, amarrado num rabo de cavalo mal feito, com minhas olheiras, olhos inchados de chorar e absoluta falta de vontade de sorrir.

Eu olhei para ele de cima abaixo, afinal, aquela não era uma atitude muito europeia, oferecer sua companhia, assim. 

Diante da minha expressão desconfiada, ele se adiantou:

- Gostou do bolo de amêndoas? Agradou à família?

Como ainda assim, eu não reagi, ele então entendeu.

- Eu a alcancei com as moedas, depois que você saiu.

Nossa! O rapaz de ontem, ele trabalha na loja, que cabeça! Fiquei morta de vergonha ao pensar que ele imaginou que toda aquela comida era para uma família inteira e não para eu afogar as mágoas.

- Sim, claro! Desculpe-me. O bolo estava uma delícia, todos gostaram. – Não ia deixar ele imaginar nada diferente.

- Posso leva-la a Versailles, aceita? A escolha das plataformas de embarque pode ser confusa.

- Sim, claro, obrigada. Alice, prazer.

-Prazer, Tulio.

Por essa, eu não esperava. Não sei bem como agir. Não sei se ele é bonito, não olhei direito. Praguejei mentalmente o fato de não poder mais comer, afinal, agora estou com fome. Não tenho coragem de abocanhar metade de um croissant, como faria sozinha, na frente daquele estranho. Será que eu ofereço a ele? Ai, ai, ai. 

Sentamos para esperar o trem e ele começou a perguntar sobre minha estadia e sobre como minha família estava curtindo a cidade, ao que eu respondi prontamente sobre como todos estavam se divertindo e como tinha sido voto vencido para o passeio de hoje, e por isso, o fazia sozinha.

A estação estava vazia, não era horário de pico. Não estava acostumada a andar de trem ou de metrô, então o fato de estar numa estação já era uma experiência nova. Os passageiros que esperam conosco não ouvem uma palavra do que dizemos e eu me sinto numa bolha com meu novo amigo que se mostra mais falante do que eu esperava neste dia de ressaca emocional.

Resolvi relaxar. Taí algo que ainda não tinha me ocorrido: eu podia conhecer alguém aqui. Local ou não. Posso estar sozinha, mas não preciso estar solitária. Muito bom. Tirando o estômago que ronca e que eu rezo para ele não ouvir, estou me sentindo bem.

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