Foi difícil convencer Jhonny a ir embora. Ele ainda
argumentou e tentou me provar que eu estava sendo inflexível. Chegou um momento
em que troquei um olhar cúmplice com meu amigo da recepção, dei as costas e me
dirigi ao elevador. Como fariam para colocar Jhonny para fora, não me interessava.
Agora, eu era como os parisienses:, ele não era mais problema meu.
Subi para o quarto, liguei a TV. Tirei o vestido, abri o
chuveiro. Saí do banho, coloquei meu pijama, tomei uma taça de vinho e me
deitei. Fiz tudo no automático. Acordei uma hora depois, e então me permiti
pensar sobre o assunto. Foram dias muito especiais. A dor intensa dos primeiros
dias deu lugar a um sentimento novo, que eu não conhecia: a curiosidade. A
vontade de viver coisas novas. Pude perceber que há um mundo novo e maravilhoso
fora das relações e das situações que pensei para mim. Permitir-se descobrir e
arriscar pode trazer frutos maravilhosos. Ficar aqui sozinha foi uma medida bem
radical para mim. Mas situações extremas, pedem medidas extremas e eu não me
arrependi.
O fato de Jhonny ter ido embora de Paris com uma estranha foi
um golpe muito duro. Sinto um frio no peito quando penso que ele foi capaz
disso. Mas também preciso reconhecer que essa relação não tinha mais para onde
seguir. Eu preciso de carinho, respeito e companhia de uma forma que Jhonny não
pode me oferecer. Isso me deixava frustrada. E a ele também. Hoje eu não posso,
mas já consigo prever que vou perdoá-lo mais adiante. Ele fez uma besteira, das
grandes. Mas antes disso, nós estávamos fazendo uma grande besteira tentando
ficar juntos.
A patrulha da cidade trabalha 24h por dia. Acho bom me
arrumar e sair. A cidade chama. De novo.
Recebo o vento frio com a cabeça erguida para o céu, os olhos
fechados, inspirando fundo. Colocar o corpo para fora da porta do hotel virou
um ritual para despertar. Vou sentir falta disso.
Decido seguir o rio e apreciar suas margens. Preciso assentar
todas as novas idéias que me surgiram na última hora, não posso deixar que elas
me escapem. A linha que me separa do agora para uma crise de choro e consumo
compulsivo de doces é muito fina, eu sei disso.
Hoje a cidade está particularmente linda. Ela se despede de
mim e eu dela. É nossa última noite juntas neste primeiro encontro. Paris
costuma ser inesquecível para quem a vê pela primeira vez. Para mim, não será
diferente. Será mais especial.
Debruço-me no peitoral erguido na calçada, acompanho os
barcos passando lotados de turistas. Escuto o barulho das águas, a conversa
animada de duas meninas e o latidos dos cachorros que se encontraram em seus
passeios noturnos. Parece estranho, mas a cidade também é feita de coisas
banais, cotidianas.
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