Meu hotel fica próximo à estação de Cambronne, enquanto o deles fica próximo à Estação Rue du Bac, mais ao norte, em relação à
minha parada. Desço me despedindo de grandes amigos, com direito a abraços e
tudo. Enquanto desço as escadas da estação, tento me lembrar do contexto em que
aceitei que Lucas viesse me pegar no hotel. Para quê? As meninas seguem na
frente, enquanto ele vem me buscar. Precisa fazer assim? Não precisa, não, mas
eu quero.
Passei na frente da boulangerie
e estiquei o pescoço, Tulio não estava lá. Que lembrança gostosa daqueles olhos
azuis. Nesse caso, eu nem me importaria de pôr cartas na mesa.
Deitei para tirar um cochilo, mas não consegui pregar os
olhos por nenhum minuto. Minha cabeça fervilhava com as cenas dos últimos
capítulos da minha vida. Como tudo tinha andado tão depressa? Eu sempre fui tão
medrosa, sempre esperei tanto para dar mais um passo. De repente, tenho um
compromisso com novos amigos na noite de Paris. Meu placar não para de subir.
Resolvi me arrumar mais cedo, assim, eu posso testar todas as
roupas possíveis. Também preciso cuidar do cabelo, o secador do hotel não dá
conta do volume do meu cabelo e preciso acompanhar com rigidez científica a
evolução do meu penteado à medida que os fios secam, colocando cada mecha no
lugar.
O celular apita. Pai. Respondo: Tudo bem, adorei Versailles. Hoje, vamos curtir a noite, depois mando
notícias. Beijos. Não tô mentindo. Nós
vamos sair mesmo. Ele só não sabe de “nós” estou falando.
Provo quatro opções e decido pelo óbvio: um conjunto preto.
Uma blusa com decote razoável, uma saia justa e meias pretas, afinal, só aqui
eu consigo usar um visual assim. A temperatura média da minha cidade não me
permite abusar nem de mangas longas. Capricho na maquiagem e gosto muito do
visual final. Mas eu gosto mais ainda da minha expectativa.
Doeu muito a saída de Jhonny. Muito. Mas havia algo que não
se encaixava no meu luto. Tinha uma pecinha solta que eu não queria reparar nos
primeiros dias. O fato de ter toda a minha programação de viagem e de vida
revirada do avesso sem prévio aviso, me deixava cega. Mas assim que eu consegui
organizar meus pensamentos, que me permiti levantar da cama e continuar em
frente, consegui enxergar melhor.
Era muito doído, detestava admitir que estava sozinha, odiava
ainda mais pensar que havia sido deixada sozinha. Mas precisava admitir, não
era tão horrível ficar sem ele.
Enquanto conversava com o trio socorrista, percebi que jamais
teria um programa como aquele com Jhonny. Eu havia programado toda a viagem,
ele havia aceitado ir depois de muita insistência. Ele não gostava de
novidades, detestava deixar de ir ao seu restaurante favorito ou de assistir
aos seus documentários no sofá de casa. Essa viagem tinha sido a primeira coisa
que ele aceitava fazer por mim. E ele desistiu antes mesmo de começar.
Ele também não me fazia rir, como Lucas fez, nem era gentil
como Tulio foi ao me acompanhar. Ele era ele e nada mais. Eu aceitava. Foi bom
variar e estar ao lado de pessoas que se importavam comigo e procuravam me
agradar. A tarde foi assim e foi boa.
Lembrei das suas birras e das discussões sobre coisas bestas.
Lembrei que ele sempre me dobrava, quando chegava em casa com meu bolo favorito
e me beijava rápido para eu não ter tempo de continuar discutindo. Lembrei do
beijo preciso, correto, perfeito para mim. Lembrei do abraço e do seu cheiro.
Estremeci. O quarto de repente ficou frio. Podia não ser perfeito, mas era meu.
Ai... e Paris segue me salvando de outro dia chato no escritório.
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