Levantei a cabeça, respirei
fundo, deixei o frio me entorpecer. Passei a mão nos meus cabelos gelados e
percebi que esqueci o gorro. Pensei em como as coisas não saem como esperamos,
em como imaginamos e não alcançamos e na mesma hora me senti besta por filosofar a partir do meu traje de frio incompleto. Boba.
Mesmo sem fome, entrei na mesma boulangerie e pedi a uma atendente mais
simpática um croissant e um café, pour
emporter. Aproveitei e, lembrando do bolo de amêndoas, perguntei à
francesinha simpática como chegaria a Versailles.
Podia ser um bom começo, sair da cidade dos apaixonados.
A mocinha loira começou a me explicar
atendo-se às plataformas que eu não podia acessar para não pegar o trem errado,
tornando a coisa toda muito complicada. Eu devia estar fazendo uma cara muito
estranha por que nessa hora um estranho se aproximou:
- Eu vou para aquele lado, posso
te acompanhar. Deseja? – falou um rapaz alto, com cabelos pretos bagunçados,
radiantes olhos azuis, um sorriso brilhante e um francês com uma pitada de
sotaque italiano. Puro contraste com meu cabelo oleoso, amarrado num rabo de
cavalo mal feito, com minhas olheiras, olhos inchados de chorar e absoluta
falta de vontade de sorrir.
Eu olhei para ele de cima abaixo,
afinal, aquela não era uma atitude muito europeia, oferecer sua companhia, assim.
Diante da minha expressão desconfiada,
ele se adiantou:
- Gostou do bolo de amêndoas?
Agradou à família?
Como ainda assim, eu não reagi,
ele então entendeu.
- Eu a alcancei com as moedas,
depois que você saiu.
Nossa! O rapaz de ontem, ele trabalha
na loja, que cabeça! Fiquei morta de vergonha ao pensar que ele imaginou que
toda aquela comida era para uma família inteira e não para eu afogar as mágoas.
- Sim, claro! Desculpe-me. O bolo
estava uma delícia, todos gostaram. – Não ia deixar ele imaginar nada
diferente.
- Posso leva-la a Versailles, aceita? A escolha das
plataformas de embarque pode ser confusa.
- Sim, claro, obrigada. Alice,
prazer.
-Prazer, Tulio.
Por essa, eu não esperava. Não
sei bem como agir. Não sei se ele é bonito, não olhei direito. Praguejei
mentalmente o fato de não poder mais comer, afinal, agora estou com fome. Não tenho coragem de abocanhar
metade de um croissant, como faria sozinha, na frente daquele estranho. Será
que eu ofereço a ele? Ai, ai, ai.
Sentamos para esperar o trem e
ele começou a perguntar sobre minha estadia e sobre como minha família estava
curtindo a cidade, ao que eu respondi prontamente sobre como todos estavam se
divertindo e como tinha sido voto vencido para o passeio de hoje, e por isso, o
fazia sozinha.
A estação estava vazia, não era
horário de pico. Não estava acostumada a andar de trem ou de metrô, então o
fato de estar numa estação já era uma experiência nova. Os passageiros que
esperam conosco não ouvem uma palavra do que dizemos e eu me sinto numa bolha
com meu novo amigo que se mostra mais falante do que eu esperava neste dia de
ressaca emocional.
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